Ierê, da nação cário, é a protagonista das duas primeiras partes de «Memórias de América». Os homens do relato atuam e falam, são muito explícitos no seu comportamento, muito evidentes nas suas posições, literais; para eles e para o leitor, a força motriz é Ierê, a que no precisa de muitas palavras, a que representa o vínculo, a que diz muito mais do que dá para ouvir.
Arturo, palentino da montanha, chega às Índias no ano de 1540
e traz consigo seus dois mastins treinados como cães de batalha. A situação em
Assunção não é a melhor para os indígenas, apesar de estarem acostumados às
guerras contínuas e à escravidão desde sempre e com certeza mais desde a
expansão dos tupis-guaranis sobre os territórios de outras nações da área.
Pouco tempo depois de Arturo, chega Cabeza de Vaca, o novo governador, disposto a
dar um trato igualitário a espanhóis e americanos, mesmo tendo que enfrentar as
tropas veteranas do capitão Irala.
Ierê, Arturo e os mastins Draa e Randa são quatro das
personagens que se esforçam por se sobrepor ao estrondo contínuo de dois mundos
em colisão. Arturo pergunta-se, pergunta a índios e soldados e talvez também ao
leitor como está acontecendo esse encontro entre culturas e por que, e como
deveria desenvolver-se. As diferentes respostas sem dúvida deixam Arturo
confuso, não acerca dos seus princípios, mas sobre as razões de cada um.
O marco histórico vem dado pelos escritos de Cabeza de Vaca
e Ulrico Schmidl, que viveram aqueles tempos e aquelas lutas e os deixaram
impressos com suas próprias palavras. A ação é proporcionada por americanos e
espanhóis; guaranis, agazes, guaicurus; soldados e civis. A visão de tudo
chega-nos através das conversas de Arturo com cada um deles, conversas
amistosas ou entre pancada e pancada.
O leitor deve decidir se quer se centrar nas aventuras de
homens e cães, na recreação histórica dos fatos ou nas questões que deveriam
lhe fazer refletir se sua posição acerca de tudo que aconteceu naquela época tinha
uma base tão sólida quanto pensava. Se ter uma opinião sobre esses assuntos é
assim tão fácil; se é etiquetar cada um como herói o vilão.
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